Thursday, April 13, 2006

DOMINGO, 7 DE ABRIL DE 1974

São já passados quatro dias na picada e o pessoal está extremamente exausto. Entre picar e flanquear, a contrariedade constantemente actualizada com novas peripécias.
Depois da recusa dos civis em prosseguir viagem, o 2º dia chegou ao fim, em Capirizange, com um cubo da Berliet partido. A informação de movimentos do IN, no Morro da Mosca, motivou uma deslocação ao sítio, dos hélios que tinham transportado o major àquela Companhia.
No 3º dia, remediada a avaria, em consequência do esforço feito pela viatura, devorando dezenas de quilómetros de picada em péssimas condições, o eixo cedeu, no vasto lamaçal de Mussacama. Resta-nos comer massarocas assadas, roubadas ainda verdes em alguma machamba descortinada no meio do mato e fumar barba de milho, por falta de cigarros. Logo, uma noite passada na estalagem estrela, com precipitação anormal para a época.
— Porque será que à tropa macaca calha sempre a missão mais desgastante e mais perigosa? — questiona-se para cá do arame farpado.
Hoje, a coluna progrediu muito lentamente até ao 10%. Se a chuva pode ajudar a enganar a sede, a fome aperta devido à ausência de alimentos, há dois dias. Os mais aventureiros aproveitam um ou outro fruto que resta nos ramos de alguma árvore isolada. Se os pássaros os depenicam, também os humanos devem poder comê-los.
Não se sabe se por compreensão pela situação vivida, se pela presença do número dois da hierarquia do Batalhão, na coluna, o certo é que, pelas 15 horas, os heróis da picada foram reabastecidos por via aérea, com uma unidade de ração de combate a ser repartida por dois homens. A isto chama-se “avareza estatal”. A solidariedade reinou no mato e muitos tropas dividiram o seu quinhão com os civis, inclusive o major Sampaio. Releve-se o gesto. São apenas cinco longos e penosos dias na picada.

0 Comments:

Post a Comment

<< Home