Tuesday, July 18, 2006

SEGUNDA-FEIRA, 1 DE JULHO DE 1974

Chegaram da Metrópole os nossos reforços. Os primeiros sortudos a gozar as férias em Portugal não desertaram e ei-los tonificados pelo repouso físico, reconfortados com o calor humano e fortificados pelo gozo das férias. Estes nossos companheiros, certamente, vêm ajudar a levantar um pouco o moral do pessoal, embora o seu aspecto não mostre o desejo de regressar ao mato. Paciência! É preciso rehabituar-se à triste realidade deste rincão africano.
Como bons companheiros, contaram-nos da evolução da democracia portuguesa e dos horrores desta guerra de guerrilha. E trouxeram alguns exemplares de jornais portugueses, relatando os ataques ao Batalhão 5014.
Espectáculo horripilante foi o que encontraram, de manhã, no hospital de Tete, ao visitarem os feridos do Batalhão. Membros quebrados, entalados em placas de gesso, cabeças partidas atadas com ligaduras, autênticas múmias vivas, sofrendo nos catres de ferro apinhados nas enfermarias. E as macas de lona amontoadas nos corredores, onde a dor é maior, o consolo é palavra vã e a esperança muitas vezes é sepultada antes do corpo. No ar, uma mistura de cheiros a éter, tinturas e pomadas inunda as narinas. A imagem que se retém, parece-se com um quadro dantesco, onde predominam os condenados e os desterrados da vida.
Lá fora, os hélios continuam despejando a carne para canhão como quem atira uma rês para o matadouro.
Na coluna, por fim, veio o morteiro 81 que foi logo experimentado, enviando três granadas para o morro do Malawi.
— Apenas um aviso! — rematou o alferes Gonçalves.


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